Entrevista a Rui Lynce, responsável da Herdade Couto dos Carvalhos, em Idanha-a-Nova, à Revista-Ruminantes. Desde 2016, tem vindo a aumentar a rentabilidade da sua exploração com um efetivo aproximado a 3000 cabeças graças à manga separadora de ovinos da Gallagher que adquiriu à Agrovete, o Sheep Auto Drafter.
"PRODUZIR COM TECNOLOGIA
Na Herdade Couto dos Carvalhos, em Idanha-a-Nova, visitámos uma exploração de ovinos para carne com cerca de 2700 animais, entre cruzamentos industriais e animais das raças Merino Alemão e Suffolk. Rui Lynce, gestor do negócio, mostrou-nos as ferramentas que utiliza para lhe facilitar o dia-a-dia e ter um conhecimento global da exploração.
Dados da exploração:
Localização: Idanha-a-Nova
Área total: 1500 ha
Área de regadio: 600 ha
Empregados: 12
Total de animais: 2700
Animais adultos: 2600 F. reprod. e 60 M.
Nº animais/empregado: 850
Nº borregos/ovelha: 1,75
Peso médio ao nascimento: 3,8 kg
Peso médio (6-7 semanas): 14 a 18 kg
Peso ao desmame: 30kg aos 90/100dias
Rui Lynce apresentou-se assim:
"Sou agricultor, lavrador, gestor... Atualmente, 100% do meu trabalho é agricultura. Iniciei este projeto em Idanha-a-Nova após um desafio do meu sogro. No entanto, também venho de uma família de agricultores. O meu avô já era o maior produtor de arroz em Alcácer e quando na escola perguntavam o que gostava de ser quando fosse grande, respondia sempre “agricultor”. A minha formação esteve sempre mais ligada aos cavalos, mas devido a um problema na coluna tive que parar. Trabalhava muito com a parte reprodutiva do cavalo lusitano e acabei por adaptar esse trabalho a este desafio. Quando comecei aqui, não percebia de ovelhas. A primeira coisa que fiz foi ir para Espanha, com a Nanta, onde estive três dias a visitar as melhores e as piores explorações com diferentes abordagens ao nível do maneio, da genética e da
alimentação. Depois, tentei aplicar o que tinha visto de mais positivo na exploração."
Como descreve o seu negócio?
É uma exploração de ovinos como principal negócio, e temos também a produção de forragens como complemento. Dentro dos ovinos, temos duas áreas diferentes de atividade, a
genética e o cruzamento industrial. A parte de genética, com as raças Merino Alemão e Suffolk, começou pela necessidade de melhorar o rebanho, para ter reprodutores para mim. Entretanto, comecámos a ter excedente e atualmente vendemos também reprodutores, mas seleciono os animais que quero para nós de acordo com as características que pretendo. Temos atualmente 100 ovelhas Merino Alemão e 10 Suffolk que pretendo aumentar rapidamente para 100. Depois temos os cruzamentos industriais para vender borregos. Claro que tudo isto é trabalhoso e exige muita dedicação! Temos problemas com mão-de-obra com frequência, mas como a minha disponibilidade é inteiramente
para isto, todos os dias, de manhã à noite,continua a funcionar bem.
O que gosta mais de fazer na exploração?
Gosto muito da parte reprodutiva e da genética. E gosto também da fase de acompanhar o crescimento dos animais.
O que é um dia típico para si, qual a sua primeira preocupação quando chega?
Típico é vir à manga e passar as ovelhas no pedilúvio. Assim que chego vou logo ver os animais que estão aqui na parte reprodutiva e à parte dos borregos para
ver se está tudo bem, se há animais doentes.
Qual o seu desafio, agora, enquanto produtor?
Produzir o mesmo número de animais ou mais, mas com menos custos. No fundo manter ou reduzir a despesa, mas com melhores resultados. Com o
investimento na manga, por exemplo, já reduzi a mão-de-obra em duas pessoas.
Tem muitos animais e poucos empregados, qual é o segredo para uma gestão controlada?
A tecnologia facilita bastante, o software de gestão e o facto de termos a manga, para além do maneio que usamos, com muitos parques de diferentes dimensões.
O contacto que temos diariamente com os animais também faz com que eles se tornem mais dóceis. Eu costumo dizer que os animais não são racionais, mas educam-se. Adicionalmente, a alimentação faz também diferença, um animal que chegue à manga bem nutrido irá ter um comportamento mais calmo. Os cães de rebanho também nos ajudam bastante no maneio; as ovelhas têm-lhes respeito mas não entram em stress, como por vezes se vê com o pastor; temos cães pastores border collie e temos também
para guarda, cães Serra da Estrela que dormem com os rebanhos.
Que investimento considera ter sido mais rentável para a exploração?
O software e a manga aumentam muito a rentabilidade. Já trabalho com manga há 6/7 anos e com programas de software. Quando apareceu a identificação eletrónica quis logo adquirir porque percebi que seria uma mais-valia.
Os números não serem bons é um motivo para refugar um animal?
Antigamente olhava para uma ovelha e dizia “esta ovelha é muito boa”, gostava muito dela por ser bonita. Atualmente, quando quero saber se a ovelha é boa, primeiro vou abrir o computador para ver os números. Já não me enganam por serem bonitas.
Disse-me que em relação aos animais cruzados vende a preço fixo o ano todo, acha que é um bom negócio?
Para mim é, porque dá-me estabilidade financeira. Todos os meses faturamos, todos os meses vendemos borregos. Vendo os borregos para o centro de engorda aqui para o Fundão, para o Paulo Brito que tem protocolo com a Jerónimo Martins. Já temos uma relação comercial de confiança que nos permite ter alguma flexibilidade ao nível dos
pagamentos de ambas as partes, são sete anos a trabalhar em conjunto.
Que cruzamento “industrial” costuma fazer e porquê essas raças?
Começou com merino da Beira Baixa, depois comprámos um rebanho de 1500 ovelhas Merino Alentejano que já tinham algum cruzamento com Merino Alemão. Cruzámos depois estas fêmeas com Suffolk e Merino Alemão. Relativamente ao Merino da Beira Baixa que havia na exploração inicialmente, não quero ser mal interpretado, é uma ótima raça para
alguém que tenha uma propriedade só de sequeiro e que tenha mato para limpar. Os borregos que têm, por ano pagam o ordenado do pastor, mantêm o terreno limpo, mas não é suficiente para quem se quer dedicar à produção de ovinos. As raças autóctones portuguesas de carne, no meu entender, perderam o caminho e não foram desenvolvidas
para produzir mais e dar rentabilidade económica.
Qual é o critério para cruzar com uma ou outra raça? Porquê duas raças e não só uma?
O objetivo é ter um grande núcleo de fêmeas quase puras de Merino Alemão e depois cruzar com Suffolk. Estou agora à espera dos resultados de um cruzamento que fiz entre animais puros das duas raças. As fêmeas que nascem destes cruzamentos com Merino Alemão, salvo raras exceções, fico com elas para o futuro efetivo da exploração.
Qual a vantagem deste cruzamento? Quem irá ganhar com isso, o produtor ou o centro de engorda?
Ganhamos todos. Eu, como produtor, consigo fazer o desmame mais cedo. O centro de engorda tem menos custos com estes animais porque atingem o peso de abate mais rápido. Por isso, ao reduzir estes custos, consigo também negociar melhor o meu produto. Temos uma relação de proximidade.
Que maneio alimentar tem?
É extensivo, prados, e depois temos fenosilagem. Na recria altero um bocado, desmamo por volta dos três meses e, além da feno-silagem e de andarem nos prados, faço também um acompanhamento com ração. São os únicos animais que comem ração, mas nem sempre é necessário.
Que forragens utiliza?
Utilizo trevo e ervilhaca. Gosto muito de ervilhaca. Há quem faça luzerna nesta região, mas eu acho muito sensível para este clima e estes solos.
Qual o maneio reprodutivo que faz? Costumam pesar todos os animais?
Desmamo aos 45 dias. Os animais que ficam, permanecem junto das mães até perto dos três meses. Entre os 9 meses e 1 ano de idade começo a juntá-las no grupo da cobrição. O primeiro parto varia normalmente entre 1 ano e 2 meses, ou 1 ano e meio. Após o desmame aos 45 dias faço a secagem e, posteriormente, são novamente cobertas. Nos animais puros faço o desmame mais tarde, aos 3 meses. Em relação à pesagem, pesamos todos os animais puros, e os restantes por amostragem.
Quais os problemas de saúde animal que mais o preocupam?
Tenho aqui alguns problemas de pieira, por causa do regadio. É o que mais me preocupa.
E onde investe o dinheiro nesta área, na prevenção ou tratamento?
Na prevenção. Faço 4 desparasitações por ano e tenho atenção às vacinações, fazendo duas a três ao ano.
Que indicadores utiliza para perceber que o negócio está a correr bem?
O principal indicador é a faturação (risos). Guio-me pela faturação anual porque este negócio tem picos.
Acha que o valor pago nesta área é um valor justo?
O valor de mercado não é um valor justo, nem nos ovinos nem nas outras áreas da produção agrícola. Se não fossem as ajudas comunitárias, dificilmente poderia haver produtos aos preços que temos. Estas ajudas têm vantagens e desvantagens. Por um lado, dão alguma estabilidade a quem não quer trabalhar tanto. Por outro lado, também nos limitam porque existem muitas condicionantes.
A seu ver, como está posicionada a carne de ovino na distribuição em Portugal?
Acho que está num valor baixo. Principalmente nas épocas típicas do Natal e da Páscoa em que as grandes superfícies colocam estes produtos em promoção. Nós trabalhamos muito mal o marketing. Comparativamente com os espanhóis, por exemplo. Ainda há muita margem para melhorar a promoção da carne de ovino.
Como vê o futuro dos ovinos na Europa?
O consumo, segundo os números que tenho acompanhado, está a crescer. A produção está a diminuir.
Portanto,diria que está no bom caminho?
Não necessariamente. Porque se não divulgamos esta produção, começa a haver menos conhecimento e não se aumenta o consumo. Por isso, para mim é preocupante a redução
do efetivo que está a acontecer na Europa. Talvez esteja relacionada com uma maior necessidade de mão-de-obra na produção comparativamente com os bovinos.
Por outro lado, a classe médica tem vindo a aconselhar cada vez mais a carne de borrego porque é a gordura animal menos saturada. Tanto que é a primeira carne que se deve
dar às crianças. O consumo está a aumentar bastante. Acho que existem boas perspetivas, se apoiadas na modernização da produção. As minhas raízes estão na produção de
equinos onde se trabalha em pequena escala, com 30, 40 animais. Quando tenho um desafio com 3000 animais, preciso de tecnologia para saber o que se está a passar. Permite-me reduzir custos e mão-de-obra, e também a probabilidade de existirem erros, já que se bem programadas as máquinas não erram.
Foi este desafio que levou Rui Lynce a decidir pela aquisição duma manga Gallagher à Agrovete: “Para as pesagens, ou quando preciso de fazer uma intervenção para separar os animais em grupos com diferentes critérios: parir, vacinar, com resultados negativos na ecografia… esta tecnologia permite-me um milhão de opções. Na prática, ajudame
a saber os animais que parem e os que não parem, os que parem e o animal se vende, ou os animais cujos filhos aproveitamos para recria. Por exemplo, eu aqui quero aumentar
o número de animais por parto. No cruzamento industrial, o objetivo é ter dois borregos por ovelha sem aumentar os custos com alimentação e mão-de-obra. Estes cruzamentos que fazemos têm muita rusticidade de Merino e a parir a dois facilmente afilham os dois filhos. No nosso sistema, as ovelhas parem, são postas num parque e ficam um dia em vigilância; depois passam para um parque onde estão três dias para ver se desafilham ou não, e depois juntam-se ao grupo. Faço grupos de parições de 15 dias. Isto permite-me
reduzir mão-de-obra a separar os borregos para os grupos de venda. Temos brincos com cores consoante os grupos, em que cada animal tem um número que permite através do software associar o borrego à mãe. Por vezes, há algum borrego que não atingiu o tamanho necessário e aí passamo-lo para outro grupo. Mas só de olhar para ele, pelo
brinco, já sabemos que vem de um grupo anterior.
Quais as principais características deste equipamento?
É uma manga que permite a presença de apenas um operador desde que os animais já estejam habituados pelo maneio. Esta manga tem também um comando à distância que facilita bastante e reduz o stress dos animais e a mão-de-obra. Sou fã da marca, acho que tem uma enorme qualidade e resistência: já vi vídeos onde se vêem carros a passar por
cima destes equipamentos, em que os põem no meio do fogo, e eles continuam a funcionar.
Que outras funcionalidades tem?
Permite-me passar até 700 ovelhas por hora. É portátil, podemos mudá-la de sítio. É feita em fibra de carbono e por isso mais leve, embora resistente. Está preparada para estar à chuva. Uso-a muito para fazer seleção de pesos da recria, e para a parte reprodutiva e separação de grupos. Também uso para vacinações, sanidade e sincronizações.
Tal como está, consigo criar três grupos,mas se comprar outro módulo posso ficar com cinco ou seis grupos.
Utiliza o Software Wezoot. Porquê?
Em primeiro lugar, porque fala a nossa língua: é português, feito em Portugal. Tem uma boa assistência porque tem uma equipa de programadores atrás disto a tempo inteiro. Tenho o telefone direto dos programadores que me vêm visitar uma vez por ano para compreenderem o maneio e conhecerem a realidade, para poderem ajudar quando existe um problema. Neste programa, consigo acompanhar tudo o que diz respeito a reprodução, crescimento, sanidade, consigo exportar dados para excel, e interagir com a plataforma do IFAP. Eu uso bastante, mas acho que não utilizo nem 10% do potencial deste software. Tem ainda um perfil para carne, para leite, e um para quem só faz raças puras onde podemos introduzir o livro genealógico e dar nomes aos animais. É um software sempre em atualização conforme as necessidades dos produtores.
Conseguiu reduzir custos com a utilização deste software?
Para começar, reduzi duas pessoas de mão-de-obra. E aumentei o número de partos. Tenho a certeza que o investimento já está pago.
Estamos a falar de um investimento de que ordem?
Se tivermos em conta o investimento com a manga, podemos apontar para uns dezassete mil euros. O tempo em que se paga depende do perfil da exploração, do produtor e do número de animais.
Leia a entrevista na íntegra.
22-07-2019